Professora e mestra em educação destaca principais mitos acerca do 7 de setembro

Professora e mestra em educação destaca principais mitos acerca do 7 de setembro

Publicado em: 7 set, 2022 às 7:52

Em 2022, o Brasil comemora 200 anos de independência. O bicentenário ainda carrega mitos acerca dos fatos que culminaram a Independência do Brasil, como: a romantização de figuras históricas, o não reconhecimento das colaborações femininas neste processo que também beneficiou uma elite, e intensificou a desigualdade social no país.

A professora de história, mestra e doutoranda em educação, Silvéria Ferreira, explica o que representa esta data para os brasileiros e como esta data pode ser avaliada, tanto para o seu contexto histórico e as suas interpretações ao longo do tempo. “A Independência como um grande marco para o nosso país, foi interpretada de várias maneiras, nós temos lá no século 19, no século 20, e até hoje é muito forte ainda um sentimento que foi colocado por uma história oficial dentro do Brasil, mas dentro da historiografia atual, nós temos outras visões, outras interpretações sobre esse mesmo acontecimento histórico. A versão oficial, ela é uma versão masculina, ela é uma versão muito elitizada, é uma versão que coloca membros políticos da época como heróis, que é o caso do Dom Pedro I, que acabou sendo eternizado dentro de um quadro que ficou muito conhecido  pela população e que deu base para o imaginário coletivo, que intitulado inclusive ‘Independência ou morte’, o quadro em que Dom Pedro II encomendou ao pintor Pedro Américo, para eternizar e também para colocar uma memória afetiva sobre Dom Pedro I, que não tinha saído aqui do Brasil com essa memória tão boa, com essa memória tão romantizada, então o seu filho Dom Pedro II, vai encomendar esse quadro e ele vai ficar pronto em 1888. Então repare, muito depois do processo Independência que aconteceu em 1822, esse quadro vai trazer para nós uma imagem muito romantizada de todo o processo da Independência, que até hoje é muito forte para o brasileiro”, disse a mestra.

A historiadora pontua que Pedro Américo construiu na época, em cima daquilo que ele ouviu falar, daquilo que o Dom Pedro II pediu, romantizando a figura de Pedro I. “Tanto que Dom Pedro I, aparece central na imagem, em cima de um cavalo, muito robusto, e é muito bonita aquela imagem dele gritando  ‘Independência ou morte’ ao lado do riacho Ipiranga, do lado dele está uma elite, uma elite privilegiada que já o acompanhava, e ao lado muito lá no cantinho do quadro a margem está um homem representando a população, puxando o gado e tal. De modo geral,  dentro desse quadro, então a gente tem  um processo de romantização, porque o Dom Pedro I, se a gente for analisar corretamente, era impossível naquele momento histórico, ele estar em cima de um cavalo, depois, o momento em que ele está ali não é o momento em que ele estaria muito bem vestido, ele não está também passando muito bem, segundo os relatos que a gente tem sobre o momento, ele estaria com um problema  de saúde. Então tudo isso não é colocado no quadro porque o objetivo do quadro é enaltecer a figura heroica do Dom Pedro I, e não colocar ali realmente o que acontecia no momento”, explicou Silvéria.

A professora destaca principais mitos acerca do 7 de setembro:

1- “Quando a gente trabalha o 7 de Setembro, a gente acaba trabalhando como um dia isolado, ‘no dia Sete de Setembro, Dom Pedro I, decretou a Independência do Brasil‘, mas não é assim, a gente tem que entender que a história ela é um processo, ela vai se dando quando várias coisas vão acontecendo e culminam num fato, no caso a assinatura do documento que trouxe a Independência para o Brasil”, disse a professora.

2- “Segundo ponto é que a Independência ela não foi pacífica, embora seja o que que é pregado, mas por quê? Porque dentro desse processo não teve mesmo nenhum conflito a nível nacional, mas houveram vários regionais, é o caso por exemplo, da conjuração mineira que a gente eternizou como mártir Tiradentes, mas que era uma conjuração de brancos da elite, e que já estavam ali denunciando o esgotamento de todo aquele sistema que se colocava e a conjuração baiana, que não ficou tão famosa porque foi feita por negros, por pessoas das classes mais populares e que também foi um processo de reivindicação contra a escravidão, contra o esgotamento que essa população já vivia”, disse a professora.

3- “Outra questão importante é que a gente não pode colocar o Dom Pedro, enquanto o único responsável por tudo isso, muito menos como herói, a gente sabe que por exemplo, a Princesa Leopoldina foi apagada da história, ela não foi enaltecida, mas ela tem uma grande colaboração para que a Independência acontecesse e outras mulheres aparecem para nós como extremamente importantes, como: Maria Quitéria, Maria Filipa, Joana Angélica, que é muito importante, que é imprescindível que a gente fale delas”, disse a professora.

4- “Por último, também pensar que a Independência ela infelizmente, não trouxe mudanças significativas para a população no geral, ela foi um processo político que beneficiou a elite, ou seja, continuou um processo de desigualdade social muito grande no Brasil, e que perdura até hoje, e que por exemplo, naquele momento, a Liberdade foi uma Liberdade política, mas não foi uma Liberdade social, com a abolição da escravidão, por exemplo, que não existiu em 1822, que só foi concretizada em 1888 e que a gente bem sabe que não trouxe  uma igualdade entre negros e brancos, que era o que o documento trazia”, disse a professora.

Silvéria compartilha dicas para quem deseja estudar um pouco mais sobre esse tema tão importante. “Para quem quer se aprofundar um pouco mais nesse assunto, eu indico para vocês 2 livros, o Independência do Brasil, que foi escrito pela Iara Lee Souza, e o segundo, Sequestro da Independência, que foi escrito por Carlos Lima Junior, Lilia Schwarcz e Lúcia Klück Stumpf, se você tiver interesse, se aprofunde, tenho certeza que será de grande valia”, finalizou.

Texto: Andrea Borges
Foto: Canva