Dia Mundial de Conscientização do Autismo: Diretora da Apae de Palmeira comenta sobre trabalho da instituição

Dia Mundial de Conscientização do Autismo: Diretora da Apae de Palmeira comenta sobre trabalho da instituição

Publicado em: 2 abr, 2024 às 20:18

Em entrevista a Ipiranga FM, a diretora da APAE (Associação de Pais e Amigos dos Excepcionais) de Palmeira, Michele de Freitas Kapp, comentou sobre o Dia Mundial de Conscientização do Autismo, comemorado em 2 de abril, e o trabalho desenvolvido na instituição em prol desses alunos.

Michele iniciou explicando sobre a complexidade do autismo, suas características e os desafios associados ao diagnóstico precoce. “O autismo, hoje chamado de Transtorno do Espectro Autista, é um transtorno neurológico que afeta, desde o nascimento ou na primeira infância, e é causado por fatores genéticos. Caracteriza-se por déficits significativos na comunicação, tanto verbal como não verbal, na interação social, na reciprocidade socioemocional e nos padrões restritos e repetitivos de comportamento, como interesses fixos e ações ritualísticas. Os indivíduos também podem apresentar hipersensibilidade aos estímulos sensoriais. É importante ressaltar que cada pessoa diagnosticada com TEA apresenta essas dificuldades em níveis e graus diferentes, sendo situações muito particulares para cada um”, explicou Michele de Freitas de Kapp.

Michele discorreu também sobre os diferentes níveis de suporte no contexto do autismo. Ela explicou que, com base no diagnóstico médico, existem três níveis de suporte que refletem as necessidades individuais de cada pessoa com autismo. Esses níveis incluem:

  1. Nível de Suporte 1: Destinado a crianças que necessitam de pouco suporte.
  2. Nível de Suporte 2: Voltado para pessoas que requerem um suporte intermediário.
  3. Nível de Suporte 3: Destinado a indivíduos que necessitam de um suporte substancial.

A atuação da Apae

A APAE atua em três áreas: saúde, assistência social e educação. Na saúde, com avaliações multiprofissionais e terapias baseadas em ABA (Análise do Comportamento Aplicada), com psicólogos, fonoaudiólogos, fisioterapeutas e terapeutas ocupacionais. Na assistência social, há auxilio nos encaminhamentos para médicos especializados, no acesso a benefícios socioassistenciais e orientação às famílias. Na área da educação, é oferecido escolarização com professores especializados, plano de atendimento individualizado, materiais adaptados, manejo de crises e inclusão.

Michele enfatizou que, embora o autismo não tenha cura, é possível buscar o máximo de autonomia para cada pessoa com autismo, visando reduzir a necessidade de suporte ao longo do tempo. Ela ressaltou a importância das terapias, do atendimento especializado e da educação personalizada para ajudar os indivíduos com autismo a alcançarem seu potencial máximo e integrarem-se de forma saudável na comunidade.

Hoje a APAE está atendendo 56 alunos, usuários e pacientes com o diagnóstico de Transtorno do Espectro Autista, e 6 ainda estão em investigação. Ao discutir os avanços das crianças com autismo, Michele compartilhou: “Cada pequena conquista é valorizada e serve como motivação para continuar o trabalho, adaptando-se às necessidades individuais de cada aluno e buscando sempre o maior nível de autonomia possível“.

Michele relatou ainda, sobre um aluno de 3 anos que vem apresentando melhoras significativas. Segundo ela, o processo não foi fácil, pois a criança inicialmente demonstrava um comportamento bastante rígido e inflexível, típico de quem tem dificuldades em lidar com mudanças e intolerância à alteração de rotina. No entanto, após um trabalho conjunto entre a família, a equipe da APAE e a professora, o aluno tem passado por uma transformação notável. Agora, ele não chora mais ao chegar na instituição e está engajado nas atividades propostas, desenvolvendo laços e vínculos com a professora.

Um dos pontos destacados na entrevista foi a importância do apoio familiar no processo de tratamento e educação de indivíduos com autismo. “Todo o trabalho terapêutico e educacional não haverá o sucesso esperado sem o engajamento da família, afinal, ela precisa se organizar e se reestruturar de acordo com as necessidades do filho. É comum dizer que um casal nunca mais é o mesmo após ter um filho, e isso se torna ainda mais evidente quando se trata de uma criança autista. A rotina da família precisa ser levada muito mais a sério, com as necessidades dessa criança sendo consideradas na reestruturação do ambiente familiar. A gente vê as respostas positivas e rápidas surgem quando há o comprometimento familiar dentro desse processo terapêutico”, explicou a profissional.

Cenário

A diretora pontuou que acredita que a comunidade está vivendo mais um momento histórico, uma vez que muitos desafios foram enfrentados, como lidar com casos de paralisia cerebral e suas sequelas, muitas vezes decorrentes da falta de políticas públicas voltadas para a atenção à gestante e a realização de pré-natal adequado, e nesse contexto, a APAE teve que se empenhar na construção e defesa de políticas que visavam reduzir essa problemática social, como também foi enfrentado períodos de trabalho árduo para lidar com as sequelas da desnutrição, estabelecendo parcerias importantes com as pastorais locais para enfrentar esse desafio.

E agora a crescente demanda relacionada ao autismo, ganha cada vez mais destaque. “Acredito que a revisão do DSM-5 contribuiu significativamente para essa discussão, proporcionando critérios mais claros e facilitando o diagnóstico precoce. No entanto, ainda enfrentamos o desafio dos diagnósticos tardios, afetando adultos que passaram por toda a infância, adolescência e juventude sem receber o suporte adequado. Os números são inegáveis. Em 2019, a APAE atendia nove alunos e usuários com diagnóstico de autismo. Este ano, esse número saltou para 56, representando um aumento significativo, equivalente a 25% do grupo atendido. Estudos apontam para a influência de mutações genéticas e fatores ambientais no aumento desses diagnósticos”, destacou a diretora.

Diante dessa realidade, é importante falar sobre o autismo e conscientizar a sociedade sobre essa condição. “Os autistas estão ingressando nas escolas da rede comum, passando por avaliações na APAE, buscando atendimento nas unidades de saúde e, futuramente, estarão presentes em maior número na rede estadual e no mercado de trabalho. É uma realidade que precisa ser reconhecida e enfrentada com políticas inclusivas e suporte adequado”, pontuou.

Inclusão escolar

A inclusão escolar é um desafio por si só, independentemente do tipo de deficiência. Quando se trata do autismo, há um agravante comportamental que desestrutura o sistema escolar. “Este é, sem dúvida, o maior obstáculo a ser enfrentado. As escolas ainda não estão totalmente preparadas para uma inclusão responsável. Estamos construindo uma história, mas ainda temos um longo caminho a percorrer nesse processo. As salas de aula e a estrutura escolar muitas vezes não facilitam a inclusão de autistas. Os ambientes são movimentados, com muitos alunos, e muitas vezes não há professores especializados na rede comum. Além disso, o super estímulo sensorial, uma das principais características do autismo, pode dificultar ainda mais a adaptação do aluno. Na educação, precisamos cumprir a Lei de Educação para Todos, como a Lei Berenice Piana, que garante acompanhamento especializado para alunos autistas que necessitam. No entanto, essa lei carece de clareza quanto aos critérios para determinar essa necessidade e a formação necessária para o acompanhante especializado”, explica.

Para Michele, as famílias estão engajadas em buscar formas de minimizar os desafios enfrentados pelos seus filhos, e as escolas estão procurando conhecimento para lidar com essa demanda. “No entanto, é importante reconhecer que a inclusão também gera sofrimento e frustrações, tanto para as famílias quanto para os professores e gestores escolares”, comentou.

Já para a sociedade, é essencial entender o transtorno do espectro autista, “pois o conhecimento e a informação são os primeiros passos para construir uma sociedade mais inclusiva“, destacou. “É importante respeitar, acolher e olhar para as pessoas com autismo sem julgamento. Além disso, apoiar as ações que promovem a inclusão e atendem às necessidades das pessoas com deficiência, especialmente autistas, e suas famílias é fundamental para colaborar nesse processo. Em resumo, é necessário informar, conscientizar e agir em prol da inclusão e do respeito às pessoas com autismo, construindo uma comunidade mais acolhedora e inclusiva para todos”, finalizou.

Texto e foto: Da redação